FILOSOFIA

Renascimento: o período que definiu a Era Moderna

Renascimento

O Renascimento foi um movimento intelectual com limites imprecisos (tanto cronológicos quanto geográficos) mas cujo auge ocorre na Itália nos séculos XV e XVI.

Influenciou diversas áreas da cultura – desde a política até a literatura, passando por todas as demais belas artes, pela filosofia e pela ciência, mas também pelos hábitos, pelos costumes e pela vida cotidiana.

O período renascentista é um período de transição. De um lado, a Idade Média, com sua visão de mundo que, quase sempre de maneira tensa, tentava conciliar as ideias filosóficas – herdadas da tradição grega – com as crenças cristãs.

De outro, a Idade Moderna, com sua visão de mundo construída a partir da colaboração da filosofia e da nova ciência que afirma-se pela negação de alguns dos pilares da visão medieval de mundo.

Tudo isso irá influenciar decisivamente não apenas a forma de pensar da Era Moderna, mas também irá direcionar as reflexões filosóficas, que irão se voltar para uma nova visão do homem e da natureza, consolidando o humanismo e dando impulso à ciência moderna.

Em grande medida, a Filosofia Moderna irá tomar como objeto de investigação os temas que surgiram durante o Renascimento, que tem como base fundamental, como já foi dito, a negação da visão de mundo medieval e um retorno à da tradição clássica dos gregos e latinos.

O Renascimento e o surgimento do humanismo


Um dos maiores exemplos da exaltação da dignidade humana no Renascimento é o texto do filósofo Giovanni Pico della Mirandola  (1463-1494), intitulado, “Discurso sobre a Dignidade do Homem”.

Tanto na visão de mundo medieval quanto na moderna o homem ocupa um lugar importante. Na visão medieval, o homem se destaca na obra da criação por ser semelhante a Deus.

Além disso, por vontade divina, o homem é posto no mundo para dominar sobre todos os demais seres. Mesmo sua queda e a condenação que se segue a ela não são suficientes para mudar isso completamente.

Mas, ainda que tenha um papel de protagonista, a história da criação, tal como narrada na Bíblia, é contada ainda do ponto de vista divino.

Uma das grandes transformações da modernidade foi dar ao homem não apenas o papel principal, mas também o lugar do narrador, acarretando consequências profundas na cultura.

Durante muito tempo ainda, Deus ocupará um espaço relevante na filosofia – veremos como o conceito de “Deus” aparece de forma importante em vários momentos da história da filosofia moderna.

No entanto, embora seja eventualmente um personagem ainda importante na visão de mundo dos modernos, não é mais um tema central como foi na filosofia medieval.

O tema central, na modernidade, passa a ser o próprio ser humano e sua individualidade. Inicialmente, a palavra “humanista” vem designar, no Renascimento italiano, um tipo peculiar de intelectual: alguém que se dedicava às humanidades, inspirado diretamente nos clássicos gregos e latinos.

Os humanistas percebiam os procedimentos escolásticos da Era Medieval como formalistas, estéreis, impessoais. Contra isso, defendiam o resgate da cultura humanística dos clássicos (principalmente os gregos) que percebiam como viva e fecunda.

Distinguiam-se igualmente por defender um ideal cultural a que se poderia chegar por meio do cultivo das humanidades.

No centro do humanismo está a exaltação da dignidade humana, que, por sua vez, fundamenta um ideal de homem a que devemos aspirar de modo a realizar nossa própria humanidade.

Um dos maiores exemplos dessa exaltação da dignidade humana no Renascimento é o texto do filósofo Giovanni Pico della Mirandola  (1463-1494), intitulado, Discurso sobre a Dignidade do Homem.

O Renascimento e a individualidade: A arte do retrato e as autobiografias


Mona Lisa

O interesse despertado pela dignidade humana vinha acompanhado, por um interesse crescente pela individualidade. Houve, no Renascimento, o que poderíamos chamar de uma explosão de individualidade.

O ideal do “homem universal”ganhava contornos muito precisos em indivíduos que se destacavam dos demais por sua singularidade: Petrarca, MichelangeloLeonardo da Vinci.

Esse interesse pela individualidade surge de forma especialmente clara na arte. Se considerarmos as artes plásticas, por exemplo, a arte do retrato foi levada ao ápice durante o Renascimento. Há, nos retratos pintados pelos mestres renascentistas, uma atenção, uma preocupação em capturar a singularidade própria do indivíduo retratado que não encontra paralelo na história da arte.

A grande admiração – o fascínio mesmo – provocada até hoje por um retrato como a Mona Lisa, de Leonardo da Vinci, é prova da excelência que esses artistas alcançaram em sua arte.

Esse mesmo interesse na individualidade que se manifesta na arte do retrato irá se refletir na literatura com a autobiografia.

Michel de Montaigne

Michel de Montaigne(1533-1592) é chamado atualmente, de forma divertida, de o “primeiro blogueiro”, pois foi seu estilo autobiográfico, mesclado de uma perspicaz exploração interior, que transformou sua obra-prima (Os Ensaios) em um marco do estilo autobiográfico que caracterizou o Renascimento.

As autobiografias não são uma invenção do Renascimento. Há exemplos notáveis na Era Medieval, como as Confissões, de Agostinho. Mas um novo estilo confessional, com uma preocupação mais acentuada de revelar o “homem interior”, começa a se desenvolver então.

Não é na Itália, porém, que encontramos o exemplo mais perfeito e acabado da autobiografia. É na França do final do Século XVI, com Michel de Montaigne, que a arte da autobiografia – do auto-retrato em sua forma literária – atinge o nível da obra-prima, comparável com o nível dos grandes retratos pintados pelos mestres renascentistas.

O exercício de introspecção e de auto-exploração que Montaigne desenvolve em seus ensaios, prenuncia o esforço de exploração da consciência e do pensamento – da subjetividade – que vai caracterizar essencialmente a filosofia moderna, influenciando posteriormente o estilo subjetivo de um dos maiores filósofos da Filosofia Moderna: René Descartes.

O Renascimento e a nova consciência da natureza


Panteísmo

Desenvolve-se, no período renascentista, uma crescente consciência da natureza como uma unidade autônoma, auto-suficiente, animada por um princípio interno – uma “alma do mundo”.

Paralelamente à nova consciência do homem que se desenvolve no Renascimento, floresce, também nesse período, uma nova consciência da natureza.

Há uma rica e diversa filosofia renascentista da natureza, assim como um movimento científico que legou algumas conclusões e posturas importantes.

No que diz respeito à filosofia da natureza e ao interesse científico pelo mundo, o Renascimento está entre, de um lado, o predomínio da teologia como ciência mais alta e, de outro lado, o domínio crescente que a ciência natural vai exercer sobre o pensamento, a partir do Século XVII.

Na perspectiva teológica, o mundo, criado por Deus, estava na completa dependência de seu criador. A natureza não é outra coisa senão a manifestação externa de Deus.

Essa perspectiva era reforçada, na filosofia, pela influência das diversas correntes neoplatônicas. Contrariamente a isso, desenvolve-se, no período renascentista, uma crescente consciência da natureza como uma unidade autônoma, auto-suficiente, animada por um princípio interno – uma “alma do mundo”.

Giordano Bruno, o mártir da ciência

Giordano Bruno foi condenado por defender uma visão de universo original para a época, afirmando que o universo era infinito e que poderiam existir vários sistemas solares além do nosso, vários mundos com possibilidade de vida inteligente.

Essa perspectiva que vê o mundo ou a natureza como um grande organismo, associada com uma postura naturalista (que enfatiza a autossuficiência da natureza e sua independência do sobrenatural) eventualmente evolui, nas especulações dos filósofos, em direção a um panteísmo, que não deixou de provocar conflitos com a Igreja, sendo seu exemplo mais simbólico a condenação e execução, pela Inquisição, do filósofo renascentista Giordano Bruno (1548-1600).

O florescimento desse interesse pela natureza, justamente por sua afirmação da autonomia da ordem natural, está, em alguma medida, em sintonia com o espírito científico que, no Século XVII, desabrochará na nova ciência da natureza proposta por homens como Galileu e Newton.

O Renascimento, como um todo, gerou um impacto tão poderoso que sua influência, como podemos perceber, pode ser percebida até os dias atuais.

Referências Bibliográficas

  1. ABRANTES, Paulo. Imagens de natureza, imagens de ciência. Campinas: Papirus, 1998.
  2. BURCKHARDT, Jacob Christoph. A cultura do renascimento na Itália. Brasília: UnB, 1991.
  3. ROVIGHI, Sofia Vanni. História da filosofia moderna. São Paulo: Loyola, 2000.