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Cultura e Cibercultura

A forma de conhecer outras culturas através das tecnologias digitais é diferente da que nos é oferecida pelas mídias de massa.
A cultura é entendida como o conjunto de costumes, crenças, comportamentos e leis que se manifestam em um determinado povo, isso quer dizer que toda cultura sempre tem um contexto muito bem definido. Todos os povos tem uma identidade cultural que é construída ao longo de sua história, e a cultura de um determinado povo afeta a percepção de mundo de seus habitantes. A diversidade cultural também ocorre dentro de uma cultura, como é o caso do Brasil, onde temos várias religiões e grupos sociais. Dessa forma, dentro de uma cultura encontramos diferentes pontos de vista e visões de mundo.
Com o advento das telecomunicações, indivíduos de várias culturas e gerações diferentes passaram a e dialogar e trocar experiências. A história está repleta de episódios onde ocorreu o encontro de culturas, o problema é que grande parte desses episódios foram marcados pela brutalidade, conflitos e dominação comandados por impérios e estados. E, mais recentemente, a percepção cultural de outros povos se dava (e ainda se dá) através da televisão, ou seja, ainda através de terceiros.
A cibercultura, por sua vez, é indiferente aos contextos e identidades culturais. Ela não representa a cultura de um determinado povo, no entanto liga pessoas de todas as culturas de forma indiscriminada. Isso torna a universalidade sua principal característica, e implica na percepção da alteridade , na mudança de costumes e na criação de novos pontos de vista. Isso se dá através do diálogo direto com pessoas que tem concepções distintas de mundo. Um jovem, conectado à internet, pode descobrir que existem outras formas possíveis de entender e representar o mundo através do diálogo. A palavra universalidade é utilizada aqui para se referir ao universo humano.
Isso não quer dizer que os velhos problemas que envolvem a alienação, o preconceito e o senso comum irão acabar, a conectividade das tecnologias digitais é indiferente a isso, mas essa interatividade representa uma possibilidade de conhecer o outro de forma mais rica e pessoal, sem os filtros comuns das mídias de massa ou da opinião alheia. Esse contato direto entre os indivíduos representa a novidade e a força da cibercultura.
Cibercultura e alteridade
A alteridade é uma experiência que nos permite conhecer o outro. Os meios digitais proporcionam a interligação de pessoas de culturas e visões de mundo diferentes, através de um ambiente que permite o diálogo direto. No entanto, esse contato implica em uma atitude aberta e descondicionada. Isso quer dizer que não podemos conhecer o outro enquanto levarmos nossa bagagem de condicionamentos e preconceitos.
Insistir em entender outras pessoas e culturas a partir de nossos conceitos e contextos é insistir em nada entender. Essa lição já nos foi dada pela antropologia. No passado, os antropólogos procuravam entender os povos “primitivos” em comparação com a “civilização”. Procuravam entender as outras culturas a partir do ponto de vista da evolução. Posteriormente, quando os antropólogos finalmente passaram a viver entre os povos que estudavam, puderam perceber a complexidade das sociedades ditas “primitivas”. Perceberam a profundidade de suas religiões, seus simbolismos, a organização de suas sociedades e estruturas de poder. Descobriram que, para os contextos desses povos, sua visão de mundo era até mesmo mais eficiente que a visão “civilizada”.
Isso não quer dizer que, no contato com o outro, devo anular minha identidade. Isso seria um absurdo, uma vez que, para que ocorra um diálogo, é necessário que todos os envolvidos tenham uma identidade. Isso é bem diferente de uma atitude aberta, que se dispõe a fazer algumas concessões em nome do entendimento ou do acordo. A alteridade permite tanto o diálogo quanto o respeito à identidade dos envolvidos.
No Brasil, onde temos várias religiões, é normal que as pessoas tenham amigos de crenças opostas. Umbandistas, evangélicos, católicos, budistas, esotéricos, ateus e agnósticos convivem sem grandes conflitos. No entanto, podemos observar na internet o crescimento do proselitismo e do preconceito. As redes sociais estão repletas de discursos virulentos e ofensas entre pessoas de crenças opostas, e o crescimento da internet só tende a aumentar isso.
Outros, mais inteligentes, utilizam a internet para ampliar seus contatos sociais e conhecimentos. Fazem amizades com pessoas de outros países e conhecem outras religiões sem deixar de lado suas crenças, aumentando suas perspectivas e pontos de vista. São comuns hoje os relatos de casamentos de pessoas de outros países ou crenças que se conheceram através da internet. Isso mostra que, quando nos abrimos para a alteridade, aprendemos mais sobre nós mesmos.
No Dicionário Filosófico, de Regina Schopke, temos um conceito bastante enriquecedor sobre a alteridade.
Acerca das relações entre os seres, diz Nietzsche, um ser é sempre um transmundo para o outro, o que significa dizer que cada ser é único, singular, insubstituível, embora nem por isso seja impossível estabelecer uma ponte verdadeira entre eles. Tal ponte, nascida do amor, da amizade ou de algum tipo de afeto, termina por unir mundos que, de outro modo, talvez jamais se tocariam.
